terça-feira, 10 de setembro de 2019

O Brasil está jogando no lixo a independência que conquistou à margem do Ipiranga

O jornalista Marcelo Zero, em 2017, na revista Carta Capital, publicou o artigo “Brasil, um pária das Relações Internacionais”. Dois anos depois, mais precisamente há oito anos da posse de Jair Bolsonaro, temos problemas vários. Com o golpe e o aprofundamento do pacote de maldades, o Brasil se tornou um pária das Relações Internacionais. Como efeito, ninguém quer muita conversa com um governo que surgiu da “assembleia geral de bandidos” de Eduardo Cunha e que já foi definido como a “quadrilha mais perigosa” do país. Desde aqueles tempos, com grave piora no momento, em cenário inconcebível há pouco tempo, líderes mundiais vêm à América do Sul sem passar pelo Brasil, o maior país do subcontinente. Angela Merkel visitou a Argentina há poucas semanas e voou direto para o México, sem sequer fazer uma pequena escala em Brasília. Sergio Matarella, presidente italiano, também esteve recentemente em Buenos Aires e Montevidéu, mas evitou contatos com governo da “turma da sangria”. Em janeiro, François Hollande esteve no Chile e na Colômbia, mas recusou-se a fazer visita oficial aos golpistas. Mesmo o generoso Papa Francisco tem se recusado a vir ao Brasil, maior país católico do mundo, por receio a uma associação espiritual e moralmente condenável. Até agora, o governo do golpe só conseguiu ser anfitrião de Macri, que se dispôs a vir ao Brasil para alinhar-se ao governo golpista com o intuito de expulsar a Venezuela do Mercosul. Nas pouquíssimas viagens internacionais, a situação não é melhor. Em sua estreia no cenário mundial, a imagem patética percorreu o mundo: Temer, anônimo, desconfortável, literalmente escanteado na foto oficial do G20, a qual revelou, de forma crua, incontestável, o isolamento de um governante sem um único voto, que causa constrangimento e embaraço por onde passa. No cenário internacional, o “fora Temer” sempre foi uma realidade. A viagem à Rússia não mudará esse fato. Moscou está preocupado com a guinada escancarada pró-EUA da política externa brasileira. Quer preservar uma relação estratégica com um Estado que faz parte do BRICS. Engole Temer para continuar próximo ao Brasil. Ninguém pode culpar a comunidade internacional por evitar contatos maiores com um governo ilegítimo e corrupto, fruto de um anacrônico golpe de estado, que nos fez retroceder ao lamentável status de uma república bananeira.

POLÍTICA EXTERNA “ATIVA E ALTIVA”
Mas, a questão maior não é essa. O atual isolamento do Brasil decorre essencialmente de uma política externa equivocada, que colide com as grandes tendências geopolíticas mundiais. Nos anos pré-golpe, a política externa “ativa e altiva” dos governos progressistas alterou profundamente a inserção internacional do país.

MELHOR DO MUNDO
(...) Celso Amorim chegou a ser classificado como o melhor chanceler do mundo, pela prestigiada revista Foreign Policy. Ao contrário do que diz o ridículo clichê conservador, foi justamente na época dessa política externa “isolacionista” que o Brasil teve mais influência no mundo. Agora, contudo, o governo ilegítimo substituiu a política externa altiva e ativa por uma política externa omissa e submissa. 

DE VOLTA AO FRACASSO
(...) Entretanto, o retorno à mesma política externa fracassada ocorre num contexto inteiramente diverso. Na época de FHC, o mundo vivia o auge do paradigma neoliberal. O Consenso de Washington dominava corações e mentes. As autoridades europeias e norte-americanas estavam empenhadíssimas na abertura comercial e financeira em todo o mundo, que era socada goela abaixo dos países em desenvolvimento. Os EUA exerciam liderança praticamente inconteste na ordem mundial marcada pelo unilateralismo belicista.

PIADA ANACRÔNICA
(...) O Consenso de Washington virou uma piada anacrônica e a liderança antes inconteste dos EUA atualmente convive com a ascensão meteórica do BRICS e fraturas entre seus aliados históricos. Assim, a ordem mundial é hoje muito diferente da que prevaleceu na década de 1990, quando os ideólogos do “fim da História” proliferaram como fungos. Além disso, está claro que o novo governo norte-americano e alguns governos europeus não têm mais o menor interesse em promover livre comércio. Dessa forma, a tragédia de ontem se repete hoje como farsa. Farsa guiada por inacreditável miopia estratégica. Enquanto em quase todo o mundo há questionamentos referentes à globalização assimétrica guiada pelo fracassado neoliberalismo, o governo do golpe investe numa arcaica e ingênua integração às “cadeias internacionais de valor”, que nos fará chutar a escada do desenvolvimento, convertendo-nos definitivamente num país pequeno e periférico.

DIPLOMACIA DO CAOS
Em meio à venda do pré-sal, de terras e do patrimônio público a preço de banana, em meio a exercícios militares conjuntos com os EUA na Amazônia, em meio à ridícula adesão do país à OCDE, em meio à destruição do Mercosul e da integração regional, e, last but not least, em meio aos coices diplomáticos dos folclóricos chanceleres do PSDB, o governo do golpe cava o buraco onde será enterrada a soberania do Brasil. Quem investe contra si mesmo, vira pária. No máximo, vira-lata. Em qualquer cenário, é país a ser pouco visitado.

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