sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Estado mínimo em um país sem o mínimo de Estado

Fala-se muito na diminuição do Estado brasileiro, especialmente no corte de funcionários, esquecendo-se que atividades como educação, saúde, segurança, assistência técnica e limpeza pública, por exemplo, só podem ser feitas com gente. Muita gente. Por mais que se ponha tecnologia na atividade, que é inerente ao setor de serviços, só se faz com muita gente. Imagine-se uma escola sem professores. Não tem jeito... 30 meninos numa sala de aula e um professor. Pode-se até pensar na educação à distância, mas é um modelo que resolve num pequeno segmento da atividade pedagógica. Não tem saúde, pública nem privada sem bastante servidores. Experimente conversar com Cláudio Montenegro ou com dr. Elano Cantídio da Oitava Rosado e da Nossa Clínica. E não poderá dizer que estão empregando por compadrio. José Antonio Lima e Lula Marques abrem o debate, lembrando que “a discussão que importa é a da qualidade dos serviços públicos, mas ela é amplamente ignorada”. A reforma administrativa anunciada pelo governo na semana passada, com corte de dez ministérios e mil cargos de confiança, é reflexo de um dos vários debates tolos travados no Brasil. Pressionada por uma crise econômica e política, Dilma Rousseff fez um anúncio para contemplar os críticos que desejam ver o Estado menor, sem tratar da questão mais importante: a qualidade do serviço público. Falta ao anúncio do governo, assim como ao debate público que o ensejou, profundidade. O corte de ministérios tem um lado positivo. Ele reduzirá marginalmente o reparte aos partidos aliados e pode contribuir para a superação do desgastado presidencialismo de coalizão brasileiro. Descontada essa vantagem, a reforma serve apenas para tentar acalentar quem vê o Brasil abatido por um suposto "inchaço da máquina pública" e advoga a redução do Estado a despeito de vivermos em um país no qual a ausência deste é tão grave quanto sua ineficiência. Em grande medida, a desinformação geral que criou essa situação é fomentada pela imprensa. O exemplo mais recente surgiu na coluna de Fernando Canzian, na Folha de S.Paulo, na quinta-feira. Em tom de denúncia, o jornalista anunciou que Lula e Dilma "fizeram explodir" o total de funcionários da administração pública federal. A primeira informação é de que os dois contrataram 129.641 servidores concursados, levando o total a 615.621. Este número é grande ou pequeno? Só saberemos comparando-o a outros equivalentes, mas a coluna não faz isso. Parte da premissa, óbvia para o autor, de que sim, são muitos. Eu, Crispiniano Neto, era assessor do diretor da Esam durante o governo FHC, que se pautava pela visão neoliberal. Mas os reitores das universidades federais reclamavam de um déficit de vinte mil professores. Vinte mil. E Lula, além de suprir esse déficit, ainda criou vinte novas universidades e mais de cem campi universitários, além de, seguido por Dilma, construírem mais de 400 institutos federais de educação. Como fazer sem empregar gente, muita gente. Mas não foram contratações partidárias. Foram concursos públicos. Só a Esam, ao transformar-se em Ufersa, passou de um campus para quatro campi, de dois cursos superiores para quase quarenta. De seiscentos alunos para quase dez mil. Como ensinar com qualidade, com duzentos alunos numa sala de aula ou num laboratório? E em cada uma delas, tem que ter um professor, que se reveza de hora em hora. Continuemos nas Notas Curtas:

Vejam na Europa...
Ao confrontar os dados brasileiros com os da OCDE, grupo dos países mais desenvolvidos do mundo e alguns em desenvolvimento, fica bem claro que tratar o número como alto sem refletir sobre seu significado é um equívoco. Em 2013, o emprego no setor público brasileiro (federal, estadual, municipal e em empresas públicas) representava 12,11% do total de empregos, enquanto a média da OCDE era de 21,28%. Acima do Brasil aparecem desde os paraísos do bem-estar social, como Dinamarca (31,89%) e Noruega (31,62%), até países de tradição bem menos estatista, como Reino Unido (23,49%) e Canadá (20,43%).

Qualidade/quantidade
O número de servidores públicos no Brasil está bem abaixo da média existente nos países em que nos espelhamos, mas há os extremamente eficientes com taxas menores que as do Brasil, como Japão (7,94%) e Coreia do Sul (7,6%), assim como há países com taxas pequenas e Estados longe de poderem ser classificados como desenvolvidos, como a Colômbia (4,1%). Da mesma forma, há Estados com taxas significativas de emprego no setor público que prestam serviços ruins a suas populações, como a Hungria (26,84%).

E o cidadão?
A questão, assim, é de qualidade, uma característica que, como os números deixam claro, extrapola o quantitativo do funcionalismo. Vale mais a pena pensar em quem são os funcionários públicos, e qual é seu nível de qualificação, e menos em quantos são eles. Na verdade, os que defendem o Estado “mínimus minimorum” são os que não precisam dos seus serviços, porque têm plano de saúde, têm os filhos em escolas privadas, têm seguranças privados nas suas casas e empresas, carros blindados, podem contratar técnicos para suas fazendas ou empresas e acham que o Estado deve servir somente aos seus interesses escusos.

Patrimonialismo
Aqui por perto são os que estão naquela lista da Assembleia Legislativa com dezenas de funcionários fantasmas que ganham dezenas de milhares de reais sem trabalhar e ainda dão trambique quando têm acesso ao dinheiro; são os que têm suas queridas mamães e titias viúvas de desembargadores e outros marajás recebendo dos cofres de um Estado pobre, como o RN, até 160 mil reais por mês, algo que dá muito mais prejuízo que os bandidos que explodem caixas eletrônicos e ainda os sonegadores de impostos que, em Mossoró, somente um foi flagrado sonegando o equivalente a quase dez escândalos do mensalão.

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